Ano novo de alguns anos atrás, eu ainda era adolescente (só pra não ficar feio, uma adulta passando por isso), minha amiga Maria e eu tínhamos combinado de juntar dinheiro pra ir acampar na Prainha Branca.
Trabalhamos horrores e juntamos nosso rico dinheirinho e com quase tudo pronto pra descer pra praia, um amigo nosso veio falando que era bobagem a gente gastar uma grana pra acampar, que ele tinha um amigo que tinha casa na praia e que era só a gente pagar a passagem dele (olha o golpe) que a gente ficava na casa sem pagar nada. Isso realmente era um bom negócio, afinal economizaríamos bastante, e seria melhor ainda, porque já que ficaríamos numa casa, poderíamos chamar mais gente!
Chamamos toda a galera, foi a Dani, o Alex, a Paty, as duas irmãs da Paty, que a gente chamava de formigas porque eram muito magrinhas, o Ricardo, o Anderson ( que era o dono da casa), o Sujeira e o Corneto. 11 pessoas no total.
Todo mundo feliz, descendo a serra com a lotação alugada. Um transito lascado e uma hora, bem na hora que tinha um carro parado do nosso lado com vários gatinhos, a Paty e a Maria, ajudadas por Daniela puxaram minha calcinha (tipo ceroulas) até a cabeça, e todo mundo começou a me puxar pra fora pelo pé enquanto eu me debatia desesperadamente. Todos os gatinhos viram minha calçola enorme. Que vergonha! Quase não falei com mais ninguém até chegar lá.
Muitas horas depois chegamos à casa de praia, que na verdade era um apartamento bem pequeno, que cabia muito apertadamente duas pessoas. Mas como nós estávamos de bom humor, na alegria, nem nos importamos de ficarmos todos espremidos no chão. Afinal, era ano novo poxa!
Na emoção do momento, fomos para praia à noite. Uma tremenda folia, todo mundo à milanesa, se rolando na areia e se jogando na água gelada da noite. Depois de algum tempo, que estava todo mundo sujo e cansado, decidimos voltar para tomar banho e dormir.
Quando estávamos chegando perto do apartamento, notamos um burburinho e uma pequena roda de pessoas. Conforme nos aproximávamos, o barulho ia aumentando até se tornar uma gritaria. Sim, uma gritaria medonha e uma mulher de enorme lateralidade xingando todos e colocando nossas mochilas pra fora. Eu não tinha entendido, mas aí ouvi direito e ela gritava que era um absurdo o Anderson levar 11 pessoas pra casa dela, que ela não ia pagar água e luz pra todo mundo, que era pra gente voltar para São Paulo... A mulher era tia do Anderson.
Minha Nossa Senhora Aparecida! Voltar pra casa de madrugada e à milanesa? A Paty, com toda sua retórica, usou sua arma mais infalível de convencimento: Desatou a chorar! E gritava: - Não moça! Nós não temos como ir embora! Por favor! É perigoso! PelamordeDeeeeus!!!!!
Eu, sempre fui muito delicada nessas situações, são cinco minutos para que eu perca minha paciência. Mas como eu não estava com muita razão, e perder a paciência só atrapalharia, segurei a raiva e falei com doçura: - A senhora tem toda razão, e peço desculpas por isso. Não ficaremos em sua casa. Mas quero pedir para que a senhora pelo ao menos nos deixe passar a noite, pois à essa hora não tem mais ônibus e estamos todos sujos.
Diante de tanta educação a megera deixou-nos passar aquela noite. Mas só aquela noite e ponto final!
Diante de tanta educação a megera deixou-nos passar aquela noite. Mas só aquela noite e ponto final!
Ninguém naquele prédio dormiu naquela noite. Ficamos cantando e dançando a Família Abadá até amanhecer. E quando amanheceu, pegamos nossas bolsinhas, botamos nas costas, e fomos embora sem rumo.
Sol escaldante do meio dia, sem filtro solar, onze pessoas que foram expulsas da casa de praia estavam sentadas na areia fitando o horizonte sem esperanças. Então a Paty se levantou e falou: - Já que estamos aqui, vamos zuaaar! O que é um peido pra quem já tá cagado?
E foi isso que todo mundo fez. Passamos o dia todo brincando, nos divertindo. Uma farofa lascada. Até tomamos o boryboard de uma criança que desatou a chorar para brincar. Menino bobo, a gente ia devolver.
Quando deu umas quatro horas da tarde, minhas costas começaram a arder, e as da Dani também. Fomos procurar um chuveiro de água doce para tirar o sal, pois já estávamos quase parecendo carne seca. Imagine, as costas com queimadura nas três camadas dérmicas e a gente querendo tomar banho de água doce. Mas, como nada entendíamos de pele, fomos atrás do chuveiro. No caminho, um surfista passou e mexeu com a gente, e a Dani imediatamente perguntou se ele não tinha um chuveiro de água doce, no que ele respondeu com o jeito cantado de surfista: - Pôu, gaatas! Vocês estão sem casa?
Com um olhar de cortar o coração mais duro, respondemos que sim. E ele quis ajudar desinteressadamente, claro, as duas lindas moças assadas, pois era um bom samaritano e caseiro de uma casa e o dono só desceria no fim de semana.
Só tinha um porém, estávamos em 11, e ele disse que só dava para chamar mais uma. Como boas amigas que somos, nem sequer pestanejamos em chamar a Maria que é irmã da Dani e deixamos que os outros se virassem. Ninguém era egoísta, imagine! Mas sacanagem à parte, ao conseguirmos abrigo, todos se ajeitaram. A Paty sempre tinha mais grana que todo mundo e alugou uma kit com seu namorado, o Alex , e mandou suas irmãs de volta pra casa. O Anderson, o Corneto, o Sujeira e o Ricardo acabaram ficando na casa do Anderson mesmo, e sua tia deixou porque eram poucas pessoas.
Chegamos na casa, eu com as costas fritas, fui deitar e acabei dormindo. Acordei com um rapaz me chamando para pedir cigarro. Na época eu fumava como uma caipora e como uma boa fumante, odiava dar cigarros. Naquele momento criei antipatia por aquele garoto, mas dei o cigarro e ele foi embora.
Depois de um tempo, sai pra conhecer o resto do pessoal da casa. Olhei para rede e o garoto do cigarro, cujo apelido era Banana, estava sentado. De repente, ele tirou o boné. Foi como uma câmera lenta. Caíram-lhe cascatas de longos cabelos loiros pelo seu tronco bronzeado. Fiquei sem ar. Que gato!
Mudei de postura na hora. Joguei o cabelo pra trás, levantei os ombros, o que me causou uma dor lancinante por esticar a pele esturricada, e comecei a fazer minha melhor cara de que “não estou nem aí para você". Algumas mulheres têm disso, é um tipo de psicologia reversa, se é correto eu não sei, só sei que deu certo e o menino ficou a fim de mim. E olha que eu estava com a pele cozida, com as faces em vermelho escarlate! Deve ser o meu charme de paulista cor de palmito, que nunca viu praia, e na primeira oportunidade que tem de ver o mar, já sai com o bronzeado para o resto da vida.
Fiquei com o rapaz e me senti como as paquitas num sonho de verão, nas nuvens de algodão, brincando de esconder, até amanhecer. Ele era absolutamente lindo. Vinha com sua prancha de surfe, com seu abdômen definido, sua pele queimada na medida, seus cabelos cintilantes. O cabelo dele era melhor que o meu.
Acabou que o menino me pediu em namoro. Uma semana na praia e eu havia conhecido o amor da minha vida. Aceitei o pedido sem pestanejar. Não importava que ele era meio tapado e que pegava o violão dos outros pra ficar tocando sons desconexos e estragava o luau. Não importava que ele falava algumas asneiras, nem que ele foi no self-service de hot-dog e encheu tanto o cachorro quente dele que a tiazinha teve que dizer: Ô fio, é servi servi, mas vamo respeitá! Nada importava, ele era lindo. Sua beleza sobressaia sua tonteirice.
Acabou que os dias se passaram e tivemos que voltar para casa. Foi muito triste a despedida. Mas tínhamos combinado de nos encontrar novamente, pois quem diria, ele morava na mesma cidade que eu e ainda tinha estudado no colégio que estudei quando criança. Era minha alma gêmea.
Combinamos de nos encontrar no dia 6 de fevereiro ao meio dia no colégio que estudamos e assim, com um beijo cálido, com lágrimas nos olhos nos despedimos com juras de amor eterno.
Continua...